Esta coluna foi escrita acompanhada de um mocaccino feito com um bourbon amarelo do Cerrado Mineiro, produzido pela Fazenda Estrela Carvalho e torrado por Anero Café
Semanas atrás, na universidade, sentamos corpo docente e discentes para uma conversa necessária com a equipe de apoio psicopedagógico. Os impactos da pandemia de Covid-19, em nossa comunidade acadêmica, é maior do que imaginava. E logo pensei que ainda não tratamos disso aqui na newsletter. Até porque parecia óbvio. Só que há detalhes — não meros — passando fora do nosso radar. Um deles diz respeito a como nosso olhar foi afetado, após tanto tempo sob mediação de videochamadas, reels e tiktoks.
Nossa geração habituou-se a curvar a fronte e se ater por horas à telinha do celular. Erguer a face e encarar o outro tornou-se um ato desafiador, constrangedor (em alguns casos obsoletos até). Voltamos ao convívio, mas os departamentos de psicopedagogia das universidades (as que conheço e trabalho) apontam para questões ainda não superadas no que tange o contato físico e o olho-no-olho.
A metáfora do olho atravessa grandes mitologias da humanidade, de gregos a budistas, de hinduístas a cristãos. Pagar olho por olho. Lançar um olhar altivo, observar por um olho mágico; intuir pelo olho de Hórus; enxergar pela Ajna, o terceiro olho do sexto chakra; suplicar pelo cuidado divino (“olhai por nós”).
Há o olho oracular da previsão, o olho maligno de fogo de Sauron e o olho cego da justiça. No ditado apócrifo, “os olhos são a janela da alma”. Vemos o exterior por meio dele e deixamos ver nosso interior pelo mesmo prisma. E aqui está o principal modo a ser reaprendido, ainda falando de pós-pandemia: olho no olho requer contato físico, interação sem mediação eletrônica.
Assinamos contratos e distratos por meio de vídeo — ou nem isso, a depender do trabalho. Fui recrutado para a CBN, por exemplo, em meio à pandemia. A conversa, a negociação, tudo foi feito via WhatsApp. Fui conhecer pessoalmente e olhar no olho dos meus colegas um ano depois. Quanta diferença. Chega ficamos meio sem jeito. A vitrine do olho, de fato, revela a alma, o humor, o amor, a dor.
Olhar e estar de olho também é ato de vigilância. Não dizem que é o olho do dono que engorda o gado? Eis a proeza da vigilância. Vigiar também configura cuidado. Muito embora, a vigilância também salte para um emaranhado de situações na pós-modernidade. A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) resulta desse processo tecnológico de troca de informações tão velozes, a ponto de atravessarmos os direitos dos outros.
Vigiar é também uma síndrome da sociedade pós-iluminista, que se tornou punitiva, segundo aponta Foucault. O filósofo francês discorre sobre a ascensão do encarceramento em massa na modernidade, como forma de correção, mas considerando que vivemos de guerra em guerra. Não apenas os conflitos belicosos civis, mas todos os tipos de tensões que, a cabo, desembocam em punição: a escola, a igreja, a família, os grupos sociais, o governo…
No dia a dia do trabalho, não é só o olho vigilante, cuidadoso ou punitivo, do dono. Mas os olhares sacramentam ou sepultam as relações. São esses olhares que precisamos voltar a exercitar, para além de qualquer medo ou ansiedade, em benefício próprio e em respeito ao outro.
Top 20 das pizzas de Brasília
Depois de quase um ano conhecendo as pizzarias que não conhecia em Brasília revisitando as melhores, cheguei a um top 20 das pizzas da capital federal. Outrora reduto ermo para quem buscava uma boa receita do patrimônio máximo da Itália, hoje a cidade ostenta ao menos 30 boas pizzas. A lista está aqui, no meu blog de crítica gastronômica, Garfo do Crítico. E o comentário completo com a lista saiu antes, com exclusividade, no meu quadro CBN Sabores, no CBN Brasília de sexta-feira. Confiram.
Coffice da semana: Salve Café Maravilha (DF)
Escondido na última entrequadra da Asa Norte, em Brasília, a 116 Norte, está o pequeno e convidativo Salve Café Maravilha. É uma gestão diferente da que iniciou o projeto. Mas preservou muitas das melhores características. O ambiente voltado para a quadra arborizada, decoração com abundância de plantinhas e badulaques legais e, principalmente, um bom café.
O espaço é pequeno, mas bem apropriado para um coffice. Há tomadas estratégicas pra plugar o computador, wi-fi, água da casa, e aquele clima para se demorar ali por um par de horas. A vitrine exibe uma boa confeitaria, com opções veganas inclusive.
Guardo melhores lembranças de anos atrás, pois foi quando conheci grandes chapas, a Cyntia Ashiushi (e seus donuts incríveis) e André Coelho, por intermédio dela. A memória afetiva reside aí.