Esta edição foi escrita acompanhada de um cold brew nitro do Los Baristas
Vivemos em um estado de espírito amnésico. No tocante à história e aos relacionamentos interpessoais. Sintoma geracional, de acordo com um estudo da Washington University, produzido pelos psicólogos Peter Kahn e Thea Weiss. A dupla foi quem chegou a um conceito de “amnésia geracional”, para atribuir aos conflitos informacionais e educacionais entre mais velhos e mais novos o esquecimento de hábitos e até mesmo do mundo natural.
É claro que a pesquisa, por precisar de uma delimitação, de um escopo e de uma hipótese caminha para um entendimento específico acerca dessa amnésia. Extraio essa pesquisa de uma reportagem muito itneressante da BBC Future (clique aqui para ler em português).
Novas gerações simplesmente ignoram desde pequenas determinados comportamentos da natureza. E não por mera falta de interesse ou pela rivalidade constante com as anteriores.
Estamos às vésperas da primavera e percebo por aqui (baseado em alguns dos exemplos da pesquisa), como as crianças de hoje têm menos (ou quase nenhum) contato com besouros e cigarras, por exemplo, que quando menino colecionávamos, categorizávamos as subespécies ou usávamos como broche.
Tem a ver com a tecnologia e o novo zeitgeist? Certamente. Mas há ainda um impacto ambiental. As populações de insetos, como de vários animais e plantas, diminuem vertiginosamente ano a ano. Chega um momento em que perdemos a referência e, fatidicamente, esquecemos.
Uma amnésia coletiva sustenta o fenômeno ao qual chamei de espírito amnésico. Estamos em uma cultura da informação, sobretudo quando evocamos a questão do trabalho, em que os mais velhos deixam de ser referência aos mais novos. Não se reconhece traços de sabedoria e de conhecimento em quem nos antecedeu.
O problema do etarismo no mercado de trabalho é uma das consequências. Além disso, há uma geração sabe-tudo, sobretudo no que tange o trato com redes sociais, em que considera-se (erronea e tolamente) estarem mais aptos ao serviço por terem sido criados sob esta tecnologia.
Mas, ora, sempre uma geração é criada submetida a novas tecnologias. O que há de diferente neste momento? A evanescência da memória. Nada é guardado.
E não é uma questão de atribuir culpa. Perdemos a mão do relacionar, do educar e do cuidar. Qual foi a última vez que você contou uma história para uma criança (quem tem criança em casa, filho, sobrinho, enteado, irmãozinhos etc.,)? Não falo em pegar um livro e lê-lo para o pequeno. Refiro-me à transmissão oral. Histórias dessas que nem o Google conhece.
Nunca tivemos tanta informação disponível. Mas tudo na Big Data (os conjuntos de dados que se avolumam em bits e bytes no ciberespaço). Nossa memória RAM, ROM e cachè foram para o beleléu. Não há mais o hábito de se decorar números (telefone, CPF, endereços de amigos e familiares). Está tudo no HD externo, vulgo smartphone.
A memória nunca foi um forte da raça humana. Ciclos de guerra e sede de poder sempre resultaram em seu apagamento. Sabe a tal história do vencedor? Pois é, a forma de transmissão da história veio sem a maior parte dos arquivos.
No entanto, essa característica, paradoxalmente, amplia-se no momento em que temos cada vez mais fontes de dados disponíveis.
Como sofri assistindo este sábado a Retratos Fantasmas, novo filme de Kleber Mendonça Filho, de quem sou fã. Sofri, com um sentimento terciário de nostalgia e de satisfação. Nostalgia pelo que se perdeu, pelas reconfigurações a que as cidades (no caso do filme, Recife) se submetem ao longo dos tempos. Satisfação por poder assisti-lo em um dos últimos cinemas de bairro do país, o Cine Brasília, que resiste sob a tutela do Estado.
Dizem que fantasmas não têm memória — saco essa informação de muitos filmes que vi e de pesquisas, admito, superficiais. Corrijam-me se necessário. Talvez porque seus espíritos foram arrancados sem que ninguém os avisasse.
O problema é que temos tratado como fantasmas quem ainda está no meio de nós. Desde a invisibilização cultural (relegado a determinados extratos da socidade) à apatia em relação ao outro, a descrença na educação (fomentada inclusive por alas políticas extremistas ainda, e infelizmente, muito atuante no meio de nós).
Sinto, infelizmente, que essa amnésia não é um sintoma apenas, mas um exercício consciente ou não para uma nova forma de se viver e estabelecer relações. Haveria um antídoto? Gosto de pensar que sou um desses que o procuram. Se encontrar, compartilho (citando a fonte, é claro)!
PS: Hoje não teremos coffice da semana, porque teremos a semana do coffice. Então se liga na notícia abaixo, porque tem, pelo menos, umas 80 indicações aí!
Brasil Coffee Week
Começa nesta quinta-feira (21) a edição Brasília do Brasil Coffee Week, um evento que reunirá cafeterias (além de confeitarias, padarias, restaurantes e bistrôs que dão ênfase ao serviço de barismo) para servir menus a preço fixo, além de workshops, bate-papos e competições de latte art.
Para o público do Distrito Federal, esta é uma belíssima oportunidade de fazer um roteirão do café especial. Brasília, sempre digo, é um das cidades onde essa cultura do café encontrou terreno mais fértil no país. Não à toa, o festival conseguiu adesão de 80 casas espalhadas do Gama a Taguatinga, de Águas Claras a Sobradinho — muitas delas novas e ainda não resenhadas em Coffice.
Certamente, esta semana do café vocês vão me encontrar fazendo muito coffice por aí.
Em Brasília, o Coffee Week vai até o dia 1/10 e, na sequência, aporta em Curitiba (12 a 22 de outubro) e em Sorocaba (23/11 a 3/12).
A lista completa das cafeterias participantes, com o detalhamento do menu escolhido por cada uma delas e fotos estão no site oficial do Brasil Coffee Week.
Atenção assinantes premium da newsletter Coffice!
Nossos maravilhosos apoiadores da newsletter, que aderiram à nossa assinatura paga, têm direito a cortesia para conhecer uma das cafeterias participantes da Brasília Coffee Week. Para isso, basta enviar um e-mail para mim (guilhermelobao@gmail.com) ou um inbox no meu Instagram @comidadepensar para receber as orientações de como desfrutar desta cortesia entre os dias 21/9 e 1/10 (vou enviar um post específico para vocês na véspera do festival, com mais conteúdo).