Esta edição foi escrita acompanhada de um Canário Catuaí 62 processado naturalmente, da Fazenda Pouso Alto em Cristais Paulista (SP), na Alta Mogiana, torrado pela Dupla Cafés Especiais e extraído pela v60 no Café do Lago
“No meu tempo era melhor”
Importante aposentar esta frase. Primeiro porque demonstra uma resistência à mudança. Ora, naquele seu tempo, daquela sua geração, o bullying era normalizado (e até estimulado); e muitas opressões, de raça e gênero, sobretudo, eram legais e hoje foram tornadas crimes.
Ainda bem.
Há muito o que se lamentar pelos dias de outrora. Eu mesmo mantenho um saudosismo enorme das videolocadoras, por exemplo. Não conseguiria, contudo, argumentar como o mundo seria melhor se elas ainda existissem.
Há muito o que se aprender também com as novas gerações que surgem. Apesar das lacunas de cordialidade, de trato social e de atenção, a Geração Z trouxe suas contribuições para a discussão de uma nova dinâmica no mundo do trabalho, ao menos.
A recente pesquisa da empresa norte-americana Intelligent acerca dos modos da Gen Z no mercado de trabalho traz indícios interessantes. A juventude nascida entre o fim dos anos 1990 e o ano de 2010 carrega alto desenvolvimento cognitivo, mas uma incrível falta de habilidades desenvolvidas.
Isso se daria, sobretudo, pela abrangência de atividades e possibilidades de aprendizado, que rivalizam com o aprofundamento ou desenvolvimento de conhecimentos específicos — o que até a geração Millenial tínhamos como principal atributo para a vida profissional.
Muitas notícias abordaram de maneira negativa o fato central da pesquisa: de que esses jovens da Gen Z querem trabalhar menos, ganhar mais e, basicamente, não assumir nenhum posto de direção. A motivação, contudo, é ótima: vida menos centrada no trabalho e mais dedicada a si (família, amigos, viagens, lazer).
O nome deste fenômeno? Quite ambition ou ambição silenciosa. Ou seja, é quase uma ausência de ambição no que tange o mercado de trabalho. E este é o resultado de relações de trabalho somados aos zeitgeists geracionais antecipados a cada ciclo.
Imagine que os baby boomers foram a geração da escalada profissional desde a juventude até a velhice, quando se aposenta da própria empresa na qual fez a carreira toda. E, seguida, a Gen X foi aquela a seguir o caminho dos boomers, com mais disposição em mudar. Mais ambiciosa, ela foi a geração favorecida pela concorrência e pela competitividade.
Os Millenials, tidos como a geração perdida (empobrecida e desesperançada), teriam como maior desafio superar a estagnação dos salários e a precarização do trabalho na virada digital. É a geração multitarefa, em que se requer múltiplas formações, habilidades e até empregos para gerar renda. A geração que não só muda de emprego, mas de formação, de carreira.
E, gerações anteriores que somos à Z, podemos e precisamos aprender com eles. Ainda que a motivação não seja a mesma — e várias críticas ao seu comportamento sejam necessárias — saibamos colocar de lado a ambição em nome de status ou de cargos, para almejar um equilíbrio que poderá muito bem favorecer nossa saúde mental e realização pessoal.
A discussão pode ser, certamente, mais longa, com muitas variáveis. Mas, que tal, desta vez, ao menos, nos permitirmos aprender alguma coisa também com os mais jovens?
Coffice da semana: BlendCacao (PR, SP, SC, DF)
Um tempo sem passar pela Rua dos Restaurantes de Brasília (404/405 Sul), me deparo com esta novidade: BlendCacao. Não é uma cafeteria, mas uma loja de chocolates finos bean-to-bar de Curitiba.
Possui unidades em Londrina, São Paulo e Florianópolis. Em Brasília, a loja funciona há 2 anos, porém, há somente seis meses acoplou um café ao balcão — cá entre nós, melhor companhia do chocolate.
Embora ainda não possua um serviço de barismo profissional, extrai espressos e v60s de grãos de ótima procedência, torra e qualidade (como a Mokado, por exemplo). Provei um Robusta, acompanhado de uns pedaços das barras de chocolates que podem ser compradas no peso ou adquiridas em uma degustação (3 sabaores acompanhados de 1 espresso).
O chocolate branco leva um toque bem interessante e adstringente de laranja, enquanto o mais amargo com castanha de caju carrega uma pitada de flor de sal, que equilibra dulçor, potencializa a acidez e estimula a salivação.
No entanto, o mais forte da casa é a coleção de bombons finos — parecem verdadeiras joias na vitrine. Todos finalizados à mão, fazem combinações clássicas (como o chocolate com caramelo) e exploram sabores pouco usuais, caso do bombom com yuzu (o delicioso limãozinho japonês, perfeito para a confeitaria).
Seria um coffice? Como digo sempre a vocês, tudo pode ser, mas é preciso conhecer a proposta do local e não ter reservas em ter antes um papo franco com a equipe da loja sobre isso. Eu mesmo costumo chegar a lugares que não se posicionam claramente como coffice sem minha mochila. Dou uma olhada e, se parecer apropriado, pergunto.
Aqui fui bem-vindo a sentar e plugar o PC para trabalhar enquanto degustava café e chocolates de alto nível. Os banquinhos e mesinhas pequeninos não oferecem muito conforto, portanto, para um coffice bem rapidinho funciona.